ERRÂNCIA. Apesar de todo amor ser vivido como único e de o sujeito repelir a idéia de repeti-lo mais tarde em outro lugar, ele surpreende por vezes em si uma espécie de difusão do desejo amoroso; entende então que está fadado a errar até a morte, de amor em amor.
CARINHO. Não é apenas necessidade de carinho, mas também de ser carinhoso para com o outro; envolvemo-nos numa bondade mútua, maternalmente nos embalamos um ao outros; retornamos à raiz de toda relação, ali onde necessidade e desejo se encontram. O gesto carinhoso diz: peça-me tudo que possa adormecer seu corpo, mas não esqueça também que o desejo um pouco, levemente, sem nada querar agarrar imediatamente.
FAZER UMA CENA. Quando dois sujeitos discutem segundo uma troca regrada de réplicas e com vistas a ter "a última palavra", esses dois sujeitos já estão casados: a cena é para eles o exercício de um direito, a prática de uma linguagem da qual são co-proprietários; um de cada vez, diz a cena, o que quer dizer: nunca você sem eu, e vice-versa. Tal é o sentido do que se chama eufemisticamente diálogo: não escutar um ao outro, mas sujeitar-se em comum a um princípio igualitário de divisão dos bens de palavra. Os parceiros sabem que o enfretamento ao qual se entregam, e que não os separará, é tão inconsequente quanto um gozo perverso (a cena seria uma maneira de se proporcionar prazer sem o risco de engendrar filhos).
EU TE AMO. Eu-te-amo não tem empregos. Essa palavra, tanto quanto a de uma criança, não é entendida a partir de nenhuma coerção social; pode ser uma palavra sublime, solene, ligeira, pode ser uma palavra erótica, pornográfica. É uma palavra socialmente errante.